Espiritismo,
Políticas e Promoção Social.
Produção Ceça Lima.
“E conhecereis a verdade e a verdade vos
libertará — João 8:32
O estudo nos educa, nos informa e clareia nossa
visão. NOS TRANSFORMA, para transformarmos o nosso entorno. Mas, no tocante ao saber sobre direitos sociais, por
várias vezes, fizemos ou ouvimos trabalhadores (as) espíritas dizendo querer se
ver longe de certas discussões do cunho social. Mesmo as que se refiram às
desigualdades de riquezas e injustiças sociais, até mesmo perguntando: ” O que EU tenho com isso? PREFIRO FICAR
DE FORA. Por que ou para que, discutir isso na casa espírita? Seria isso
preocupação de Espíritas Materialistas (Sim. Existe quem fale isso e em tom
ofensivo). ”
Acredito que trazer algumas histórias reais do
cotidiano, poderia nos ajudar nas reflexões para construção desse texto. E,
quem sabe, nos ajudar a desenvolvermos um trabalho de diálogo. Onde, a pessoa
leitora entenda melhor, seja por recordar alguém ou por ela própria se
identificar descrita em algumas linhas. Então, agora lhes convido a divagar
pela imaginação. Mas, antes lhes peço licença para dizer que “qualquer semelhança será mera
coincidência. ”
Imagine
que um Indivíduo ativo da sociedade espírita que você frequenta, sofreu um
acidente e está impossibilitado de trabalhar, ou foi demitido e ficou sem
renda, ou por uma desventura foi preso deixando família sem recursos, ou faleceu
(deixando filhos menores de idade e viúva). Vale imaginar também, que chegou
visitante de fora e bateu à porta do “nosso” centro espírita, com demandas
semelhantes. E que, em todos os casos, não há previsão para que surja alguma
reversão das consequências dos fatos ocorridos. Ou suponhamos que um vírus
chamado COVID-19 surgiu devastando a humanidade. E que para combate-lo e salvar
muitas vidas, se faz preciso praticar o isolamento social, por tempo
indeterminado. E que por isso, muita gente ficará sem renda nesse período, até
tudo se arrumar outra vez.
Imaginação ativada, agora trago a seguinte
pergunta: Seria o centro espírita, através, seja
do setor de atendimento fraterno, da sopa, da feira e/ou do enxoval,
suficientemente capaz de suprir tantas necessidades da proteção básica, numa
situação de tantas
fragilidades? Ou seria mais coerente se apropriar dos caminhos para
adquirir o acesso às políticas públicas vigentes no nosso país e que poderá
ajudar de forma muito mais eficaz, a diminuir as expressões da questão social,
que batem nas portas dessas histórias imaginadas?
Caro(a) leitor(a), se a essa altura você já se
sente interessado(a) em conhecer outras formas, outros caminhos e novos espaços
para poder encaminhar quem procura o centro, fale bem alto em sua mente que “SIM. Isso é da minha conta e eu quero
entender melhor sobre isso. Para melhor poder de fato AJUDAR. ”
Como somos
espíritos ainda encarnados e pagadores dos “tributos à César” (impostos),
cumprindo com as nossas obrigações terrenas, temos o DIREITO de reivindicar o
retorno de tais compromissos cumpridos para com o Estado, que por sua vez
deverá cumprir o seu DEVER no tocante ao que está posto na Constituição da
República Federativa do Brasil(1988) onde nos traz:
Título VIII
Da Ordem Social
Capítulo
II
Da Seguridade SocialSeção I
Art. 194. A
seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos
poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à
saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único. Compete
ao poder público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base
nos seguintes objetivos: I - universalidade da
cobertura e do atendimento; II -
uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e
rurais; III - seletividade e distributividade
na prestação dos benefícios e serviços; IV -
irredutibilidade do valor dos benefícios; V -
equidade na forma de participação no custeio;
VI - diversidade da base de financiamento VII -
caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a
participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e
aposentados.
Agora que já sabemos da existência de uma
seguridade social complementar, destacamos que, "A Assistência Social é a
política de seguridade social, que prevê os mínimos direitos sociais,
realizados através de ações integradas de iniciativa pública e da sociedade
civil para garantir o atendimento às necessidades básicas. E assim vimos
compartilhar a ideia do quanto precisamos quebrar a barreira do preconceito e
tentar aprender sobre alguns exemplos de políticas públicas como: Bolsa
Família, Isenção em Concurso Público, Tarifa Social de Energia, Benefício de
Prestação Continuada-BPC(LOAS), Auxilio Funeral, Auxilio Reclusão, Carteira de
Habilitação Nacional-CNH Popular, Identidade Jovem, Auxílio Emergencial, Etc...
Como tantas outras, voltadas para saúde e previdência social.
Se, você considerou a
constituição brasileira, viu que nela aprendemos que ao Estado compete assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência social.
Criando ações socioassistenciais preventivas e protetivas, que são DEVER do Estado e DIREITO dos cidadãos e cidadãs. Essas ações têm por finalidade
atender a população que vive em situação de fragilidade decorrente da pobreza,
ausência de renda, acesso precário ou nulo aos serviços públicos e/ou
fragilização de vínculos afetivos por: discriminações etárias, étnicas,
religiosa, gênero, identidade de gênero ou por deficiências, entre outras.
Portanto, percebe-se que não são as ditas caridades
materiais que devemos priorizar e unicamente considerar, quando pensamos em
ajudar quem nos procura no centro espírita. E quanto a essa questão, o
espiritismo nos oferta as seguintes certezas em O Livro dos Espíritos - Item
888:
“Condenando-se a pedir
esmola, o homem se degrada física e moralmente: embrutece-se. Uma sociedade que
se baseie na lei de Deus e na justiça deve prover à vida do fraco, sem que haja
para ele humilhação. Deve assegurar a existência dos que não podem trabalhar,
sem lhes deixar a vida à mercê do acaso e da boa-vontade de alguns.”
E ainda temos o Evangelho de Jesus, que nos mostra o
verdadeiro sentido da caridade e sublimidade do conceito de amor ao próximo,
conforme concluímos dos seus ensinos:
Pois eu tive fome, e vocês me
deram de comer; tive sede, e me deram algo para beber; fui estrangeiro, e vocês
me acolheram; necessitei de roupas, e vocês me vestiram; estive enfermo e
preso, e vocês me visitaram' (Mateus XXV.31-46); O Bom Samaritano (Lucas X:
25-37); “Tudo o que quereis que os homens vos façam, fazei também a eles...”
(Mateus VII:12); “Tratai todos os homens como quereríeis que eles vos
tratassem.” (Lucas VI:31); O que é necessário para salvar-se (Mateus
XXV:31-46); O amar aos inimigos (Mateus V:43-47; Lucas VI:32-36).
Na sua obra O Espiritismo e os Problemas
Humanos, Deolindo Amorim, nos fala que:
“Com estas
questões que não podem deixar de entrar em nossas cogitações, porque os
problemas existem, estão aí, com eles nos defrontamos a todo o momento, o que
desejamos é, naturalmente, formular um convite, para que pensemos em conjunto,
procurando auscultar e sentir em profundidade o autêntico espírito da
Doutrina.”.
Ao que o
codificador de Lion nos acrescenta:
“Moralmente, a
Humanidade progride pelo desenvolvimento da inteligência, do senso moral e do abrandamento dos costumes. Ao mesmo tempo
que o melhoramento do globo se opera sob a ação das forças materiais, os homens
para isso concorrem pelos esforços de sua inteligência. Saneiam as regiões
insalubres, tornam mais fáceis as comunicações e mais produtiva a terra.” Em A Gênese no Cap. XVIII.
Em A
Gênese" cap. XVIII, item 25 lemos que:
a solução da questão social, diz Kardec, está toda no
melhoramento moral dos indivíduos e das massas. Não é o Espiritismo que cria a
renovação social, mas o amadurecimento da humanidade que fará disso uma
necessidade.
Já com os
questionamentos feitos por Kardec aos espíritos, somos ainda mais esclarecidos
com as seguintes respostas:
806. A desigualdade das
condições sociais é uma lei natural? — Não;
é obra do homem e não de Deus. 806
– a) Essa desigualdade desaparecerá um dia? — Só as leis de
Deus são eternas. Não a vês desaparecer pouco a pouco, todos os dias? Essa
desigualdade desaparecerá juntamente com a predominância do orgulho e do
egoísmo, restando tão somente a desigualdade do mérito. Chegará um dia em
que os membros da grande família dos filhos de Deus não mais se olharão
como de sangue mais ou menos puro, pois somente o Espírito é mais puro ou
menos puro, e isso não depende da posição social. 807. Que pensar dos que abusam da superioridade de sua posição social
para oprimir o fraco em seu proveito? — Esses merecem o anátema;
infelizes deles! Serão oprimidos por sua vez e renascerão numa
existência em que sofrerão tudo o que fizeram sofrer. (Ver item 684.)
Para reforçar nossas reflexões lemos em Manuel
Porteiro, que nos traz na sua obra Conceito Espírita de Sociologia:
...”Ante esta perspectiva
grandiosa que o Espiritismo nos oferece para a sociedade do futuro, e que não
é, como se costuma dizer, uma concepção utópica, “produto de cérebro
anarquizado”, como poderíamos nós espíritas permanecer indiferentes diante dos
crimes sociais, da exploração de uma classe dominante, que garante seu poderio
e o monopólio da riqueza social na razão da força, sobre a ignorância dos povos
e o falso ensinamento de uma moral interesseira? Como poderíamos concordar com
esta ordem social estabelecida sobre a desordem dirigida pelo império da força?
Como poderíamos contemplar a imoralidade, o vício, a injustiça, a exploração e
o roubo sociais – que se querem fazer passar por coisas muito justas, boas,
morais – sem manifestar nosso repúdio? Como poderíamos conviver com a
hipocrisia e a mentira, se os princípios que sustentamos a elas se opõem? Como,
enfim, poderíamos nos conformar com a situação do regime atual criado sobre
privilégios iníquos, se o Espiritismo nos fala de uma sociedade melhor, de paz,
de amor, de fraternidade e de justiça, e da possibilidade de realizá-la? Quem
há de realizá-la, admitida sua possibilidade, se não os homens que nela creem,
por seu esforço contínuo, com a prédica perseverante, com o propósito declarado
à paz do mundo, com a ação constante no impulso moralizador nessa direção e
pelos meios mais eficazes e convincentes?
Agora, para o
encerramento de nossas reflexões, negando ser invencionismo ou coisa de
“espíritas materialistas”, trazer tais debates para as discussões espíritas,
achando que o curso do sofrimento deva seguir, em favor de um “resgate das
dívidas ou provas”, e por isso não deve-se
pôr termo às provas do próximo, deixaremos como tarefa de casa, sugestão
para irem buscar o que Bernardim, espírito protetor, responde em Bordeaux, em
1863, demonstrando quanto é necessário o estudo e a reflexão das ideias e de
conceitos pessoais, a fim de evitar-se conclusões erradas(O Evangelho Segundo o
Espiritismo - Capitulo V - ITEM 27 - - BERNARDIM - ESP. PROTETOR, BORDEAUX
1863).
Excelente texto. Traz luz para um momento de extrema dificuldade. Notas esclarecedoras para a sociedade comum, e a comunidade espírita. Parabéns pelo requinte de informações, pautadas e justificadas em obras Kardeciana. Desta forma, os "espíritas" que resistem a pauta social da doutrina, e desdenham da nossa fala, quando trazemos a miúde, as palavras do próprio Kardec, souber a doutrina ser progressista. Mas uma vez, quero dizer-lhe da minha alegria, em ler um texto tão lúcido. Abraços
ResponderExcluirTexto bem fundamentado. Parabéns! "Fora da Justiça Social não tem salvação!"
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirTexto excelente, que possamos adotar o método socrático, deixando de lado a opinião e embasar nossa fala e ação no conhecimento!! Fora do amor ao próximo, que inclui Justiça Social, não teremos seres humanos melhores! E tão contrário ao amor, não é o ódio, mas a indiferença aos problemas sociais!
ResponderExcluirÓtima reflexão!
ResponderExcluirÉ muito alentador ver gente tão empenhada em pesquisar e resgatar a doutrina espírita do aprisionamento ritualístico e mistificador em que se encontra o Movimento Espírita Brasileiro.
Lembro que quando eu era criança, pelo menos aqui em Pernambuco, houve uma certa movimentação no sentido de buscar-se soluções/ações voltadas para a promoção social. Fico me perguntando o que ocorreu para que todo esse esforço desse lugar à tamanha omissão que vemos nos dias de hoje; para que as pessoas se sentissem tão confortáveis neste papel de acomodação e silêncio diante de tanta injustiça social...
O que consola é que podemos mudar essa realidade, né? Com muito estudo, muita pesquisa, resiliência, ação e compartilhamento de informações!
Muita paz!
Texto simples e elucidativo!
ResponderExcluirA caridade, deixada como lição a nós por Jesus, é entendida pela maior parte das (os) espíritas apenas como as ações assistencialistas oferecidas pelos centros, que são necessárias para suprir as necessidades materiais básicas dos seres em maior vulnerabilidade, contudo ela perpassa este sentindo, toma uma amplitude a ponto de convidar a/o espírita ao engajamento na luta por políticas públicas que garantam a justiça social e como o próprio texto expõe, estes são temas contidos nas mais importantes obras da Doutrina. Caridade é a busca pela justiça social, embasada nos ensinamentos de amor do Cristo!
Artigo de opinião bem embasado. Parabéns Peça!
ResponderExcluirPoderia considerar esse um texto referencial para a compreensão da temática proposta. Certamente irei indicá-lo para que outras pessoas possam ler e se colocarem disponíveis ao debate de tão relevante tema. Abraços em todos do Ágora, em especial à Ceça a quem parabenizo pelos esforços na boa luta de construção de um novo tempo no Movimento Espírita.
ResponderExcluirReflexão rica e bem embasada.Parabéns Ceça
ResponderExcluirParabéns ao Ágora e a Ceça pelos esforços na construção de um mundo mais justo e, por consequência melhor. Contribuição que nos levem a pensar sempre são bem vindas!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirExcelente texto!
ResponderExcluirSendo a Caridade o amor em ação, a Assistência Social das Instituições Espíritas, não deve limitar-se ao assistencialismo material, que muitas vezes torna-se "hereditário, negando aos seus assistidos o direito à assistência do governo, que lhes é facultada por direito, impedindo-os de resgatar sua dignidade e cidadania.
Vejo com muita tristeza meu ex evangelizandos,hoje casados e pais recebendo as feirinhas que já eram dadas aos seus pais, desde a época em que frequentavam as nossas salinhas de Evangelização.
Rogo a Deus, que os Dirigentes das Casas Espíritas, tomem conhecimento das discussões realizadas pelos Coletivos e tenham a humildade de reconhecer seus erros, mudando essa triste realidade.
Parabéns, Ceça!
Tão pertinentes ideias e reflexões, e que atendem a um anseio que carrego em mim, que é o de propor, criar proposições. Este artigo é ousado do ponto de vista daquilo que propõe. Propor reflexões que questionem a práxis, que questionem a ordem natural e estabelecidas das coisas, e em contra partida dar-lhes a possibilidade de uma devolutiva de ações e de possibilidades de experimentos.
ResponderExcluirAfinal de contas o que seria de nós sem a perspectiva de experimentar e de ousar? Parabéns Ceça Lima, ousasses e continues, peço eu, ousando e ofertando oportunidades de reflexões com possibilidades de ações que quebrem padrões e ofereçam condições de ampliação e melhorias.
Gratidão é a palavra que eu utilizo para ti neste momento.